Eletrificação dos transportes pesados
Vanessa Faia – Técnica Especialista na ADENE – Agência para a Energia26/12/2023 Desafios e perspetivas futuras.
Quais são as necessidades que surgem da eletrificação dos transportes pesados? E as principais oportunidades? São estas as questões a que iremos responder ao longo deste artigo que se focará essencialmente nos transportes pesados rodoviários.
Para atingirmos a neutralidade carbónica em 2050 é essencial reduzir as emissões de CO2 do setor dos transportes, responsável por 25% das emissões de CO2 na União Europeia. Para tal, é necessário acelerar a transição energética deste setor, através da eficiência energética e da eletrificação.
Para a melhoria da eficiência energética dos transportes, as entidades contam já com o apoio da ADENE – Agência para a Energia através do sistema de avaliação da eficiência energética de frotas MOVE+® que se encontra em funcionamento para frotas de ligeiros e de pesados de mercadorias, estando já em desenvolvimento para pesados de passageiros. Através de uma metodologia simples e ágil, o MOVE+® permite monitorizar e avaliar as frotas com base na sua eficiência energética bem como identificar oportunidades de melhoria.
Por sua vez, a eletrificação traz novos desafios como a preparação da infraestrutura pública para o carregamento dos veículos elétricos pesados, que é atualmente quase inexistente, bem como da infraestrutura privada, como parqueamentos privados de veículos e centros logísticos.
Como podemos preparar as instalações para responder aos desafios da mobilidade elétrica dos transportes?
O Regulamento relativo à criação de uma Infraestrutura para Combustíveis Alternativos (AFIR) traz já algumas novidades nesta área. Este Regulamento prevê que, até ao final de 2030, exista pelo menos uma estação de carregamento para veículos pesados, com potência suficiente para permitir o carregamento destes veículos dentro do tempo de pausa regulamentar do condutor, a cada 60 km nas estradas principais da rede principal da RTE-T (rede transeuropeia de transportes) e a cada 100 km na rede global da RTE-T de maior dimensão. Prevê ainda a instalação, até 2030, de pelo menos quatro estações de carregamento, acessíveis ao público, dedicadas a veículos elétricos pesados, em cada zona de estacionamento segura e protegida, e de infraestruturas de carregamento rápido em cada nó urbano.
A preparação adequada de uma infraestrutura de carregamento robusta é essencial para dar confiança às empresas na aquisição de veículos pesados elétricos, atenuando as barreiras à adoção destes veículos, que se prendem principalmente com o tempo de carregamento e alterações à operação diária das entidades.
A PepsiCo, que utiliza já camiões elétricos da Tesla para a sua operação diária, deu nota recentemente sobre o desafio que constitui a preparação dessa infraestrutura, nomeadamente do aumento de potência necessária para a instalação de carregadores suficientemente rápidos para não prejudicar a sua operação (que permitem o carregamento de 80% da capacidade do veículo em menos de 45 minutos). Este e outros desafios identificados reforçam ainda a necessidade do planeamento prematuro da infraestrutura, pois a realização da operação diária com recurso a estes veículos é fundamental para a viabilidade destas soluções.
Mas a transição não traz apenas desafios. Quais são as novas oportunidades?
A implementação de infraestruturas com pontos de carregamento inteligentes e digitalmente conectados, aliada à implementação de contadores inteligentes que permitem recolher dados de carregamento em tempo real, contribuem para a otimização do carregamento. Estas tecnologias permitem que o carregamento seja gerido, automaticamente, de forma a maximizar a utilização de eletricidade renovável e minimizar os custos de carregamento. Além disso, o carregamento inteligente contribui para a estabilidade da rede elétrica, evitando picos de consumo, uma vez que permite gerir a potência consumida no carregamento distribuindo a energia de forma proporcional por todos os postos de carregamento em funcionamento e limitando o consumo à potência contratada.
Outra vantagem da eletrificação é a possibilidade de carregamento bidirecional (veículo para rede), que contribui para uma maior flexibilidade do sistema energético, promovendo a redução das emissões dos veículos e do sistema elétrico. No carregamento bidirecional o veículo funciona como uma bateria utilizada para armazenar energia elétrica, idealmente de fontes renováveis, e que fornece essa energia à rede em horas de pico ou em momentos de reduzida produção de energia renovável.
Apesar dos diversos desafios inerentes à eletrificação dos veículos pesados de passageiros, que se prendem essencialmente com a preparação da infraestrutura de forma a garantir a possibilidade de carregamento nos períodos de paragem dos condutores, a eletrificação e a gestão dos carregamentos, com uma gestão inteligente da potência e a bi-direcionalidade, podem contribuir para a estabilidade e flexibilidade da rede elétrica, quando realizados de forma digital e integrada.
