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Evolução do Solar PV de larga escala em Portugal: mitos e factos

Susana Serôdio | APREN05/03/2021
Portugal mostra-se no panorama europeu como um dos mercados mais promissores para o desenvolvimento da energia solar fotovoltaica, tanto pela localização geográfica privilegiada em termos de recurso, como pela visão estratégica de desenvolvimento do setor renovável incluída no Plano Nacional de energia e Clima para 2030 (PNEC 2030).
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Contudo, no fim de 2020, a potência solar fotovoltaica no País (cerca de 1 GW) respondeu a uma pequena parcela do consumo de eletricidade nacional, de apenas 3,2 %, num cenário em que a eletricidade renovável como um todo representou 58,1 % da procura.

Ainda antes dos dois leilões de capacidade de reserva realizados em 2019 e 2020, o holofote já estava, em pleno, na tecnologia solar fotovoltaica, pois apresentava a maior margem de desenvolvimento no país, com um ponto de partida longe do objetivo para 2030. Nesta ótica, é importante olhar para trás, para compreendermos o trajeto e decisões até agora tomadas para o desenvolvimento do setor solar fotovoltaico de larga escala e para avaliarmos crítica e estrategicamente qual o caminho que o país deve seguir para desenvolvimento de um setor com importantes benefícios para a economia, ambiente e sociedade.

Numa perspetiva histórica, a promoção da eletricidade renovável na Europa, e consequentemente em Portugal, inicia-se em 2001 com a publicação da primeira Diretiva Europeia relativa à promoção da eletricidade produzida a partir de fontes de energia renováveis, que veio, pela primeira vez, impor quotas específicas de incorporação renovável, assentes numa política estratégica que desse resposta aos compromissos a que o mundo apelou no âmbito do Protocolo de Quioto. Nesta primeira fase, o compromisso europeu teria inequivocamente de passar pela criação de economias de escala para a integração de renováveis no mercado interno da eletricidade, abrindo a porta à aplicação de mecanismos que permitissem a prestação de apoio direto ou indireto aos produtores de eletricidade renovável.

Posto isto, nos anos seguintes, são introduzidos por todos os Estados-membros esquemas de suporte para promover a eletricidade renovável (RES-E), na sua maioria, com base em tarifas de remuneração fixas, conhecidas como “feed-in tariffs”. Portugal, a par com alguns países europeus, já tinha anteriormente reconhecido o estatuto de produtor independente com regras aplicáveis às energias renováveis, que visava a integração e operação principalmente das pequenas centrais hídricas, já com elevada penetração em Portugal, que surgiram com o objetivo de promover a diversificação das fontes numa perspetiva de redução da dependência energética externa. Já na altura, a elevada dependência dos combustíveis fósseis era apontada como uma necessidade urgente de colmatar, com o intuito de minimizar a exposição a fatores económicos e geopolíticos.

Assim, para dar resposta ao novo contexto e estratégia europeia, Portugal revê o diploma existente, introduzindo novas tecnologias em expansão, a eólica e a solar, e estabelecendo, à semelhança de todos os restantes Estado-membros, tarifas feed-in, diferenciadas por tecnologia, tendo em consideração a disponibilidade, custos de operação e manutenção, valorização ambiental, disponibilidade, entre outros. Neste enquadramento, a primeira central fotovoltaica de larga escala em Portugal surge em 2006, a central fotovoltaica Hércules em Serpa, com 11 MW, num consórcio entre 3 empresas. Seguidamente, em 2007, começam também a surgir as primeiras pequenas unidades de produção descentralizada – as centrais de microprodução - numa ótica de dar espaço aos pequenos produtores numa perspetiva de otimização dos recursos energéticos, e ter em consideração a natural evolução do mercado da eletricidade e capilaridade da própria tecnologia solar.

Mesmo assim, apesar da política existente, Portugal chega a 2010 com apenas 134 MW, isto porque a tecnologia solar era considerada pouco madura, dispendiosa e com uma vertente mais direcionada para instalações ligadas ao ponto de consumo e, como tal, pouco competitiva com o solar térmico em expansão à data. Contudo, e ao contrário do que ocorreu em Portugal, observou-se uma forte proliferação de sistemas e da indústria fotovoltaica pela Europa atingindo-se, em 2010, uma potência instalada de cerca de 30 GW.

Sob este pano de fundo, em 2010, Portugal tenta expandir o setor, lançando um leilão para atribuição de 150 MVA de capacidade de injeção na rede de centrais solares fotovoltaicas e de concentração, dando, ao mesmo tempo, resposta a problemas de indisponibilidade de rede que já se identificavam na altura. Este baseava-se no sorteio de lotes de capacidade que eram atribuídos mediante a mais elevada contrapartida financeira oferecida ao Estado, aplicando-se o regime de tarifa feed-in em vigor, sem qualquer outra recompensa específica. Este leilão contou com a participação de 17 empresas nacionais e estrangeiras, a sua grande maioria pequenas e médias empresas e possibilitou ao Estado arrecadar mais de 100 milhões de euros em contrapartidas.

Contudo, por esta altura, Portugal encontrava-se numa profunda recessão económica, fruto da crise de 2008-2009. Neste novo contexto económico e financeiro, em 2012, o Decreto-Lei de promoção de energias renováveis de larga escala em Portugal é revogado, permanecendo apenas com o incentivo à pequena produção. Este cenário, sem quaisquer planos ou visibilidade de promoção do setor, levou a uma total estagnação do crescimento do setor e mesmo à extinção de várias empresas. Assim, em 10 anos (2006-2016), o setor solar fotovoltaico vê apenas a instalação de 600 MW, dos quais mais de metade eram pequenas unidades de produção descentralizada.

Também na Europa, o setor é profundamente abalado com a crise, e o investimento no solar fotovoltaico sofre quebras, enquanto vê outros mercados a expandirem e a assumirem por completo o desenvolvimento e fabrico da tecnologia, com uma redução disruptiva do preço (de cerca de 7€/Wp para 0,5€/Wp), tornando-se em 10 anos a tecnologia mais competitiva do mercado.

Por outro lado, em consonância com a estratégia europeia para harmonização e unificação do mercado interno de eletricidade da UE, o sistema elétrico sofreu uma profunda transformação, com a liberalização do setor elétrico e, em Portugal e Espanha, com a entrada em pleno funcionamento, em 2007, do Mercado Ibérico de Eletricidade. Em consequência, as tarifas feed-in começam a ser objeto de crítica ao longo dos anos por serem um mecanismo paralelo ao mercado estabelecido, instituindo-se uma ideia invertida do papel das tarifas feed-in na Europa. Por outro lado, identificou-se uma falta de sensibilidade para interpretar o impacto das renováveis na redução do preço da eletricidade num mercado marginalista não desenhado para tecnologias de capital intensivo. Não obstante as críticas, este mecanismo de apoio constituiu a base necessária para a Europa criar um portfólio invejável em termos de tecnologias renováveis, considerado como o Continente 'Modelo' e de liderança neste setor. Este modelo foi o motor de desenvolvimento da tecnologia eólica na Europa, que ainda lidera e com a qual permitiu também a Portugal consolidar um setor eólico, gerando milhares empregos diretos e indiretos, sendo hoje uma importante base de know-how a operar em diversos mercados mundiais.

O novo pacote de energia limpa para 2030

Voltando ao solar, e continuando a cronologia, em 2017, a Europa começa a preparar o novo pacote de energia limpa para 2030, altura em que Portugal recupera, a olhos vistos da crise, captando um crescente interesse por parte de investidores, com particular expectativa no solar fotovoltaico. Com a disrupção tecnológica, os leilões passaram a virar prática comum em toda a Europa, atingindo-se preços record 38€/MWh (IRENA, 2018), e Portugal, dada a sua posição geográfica, atraía diversos promotores interessados em desenvolver projetos. Contudo, Portugal não tinha qualquer enquadramento específico para a promoção de projetos de renováveis, sem um calendário de leilões que desse visibilidade e segurança para se assumir o risco de ir a mercado. Mesmo assim, com a eletricidade no mercado MIBEL a ser mais valorizada que no mercado central europeu, os projetos começam a ser rentáveis em mercado através de contratos de compra e venda de energia a longo prazo (PPAs) e dá-se então uma viragem no setor, com progressivos pedidos de licenciamento de projetos solares, o que vem reintroduzir um antigo problema: a disponibilidade de rede. A par com a evolução renovável em Portugal, também o investimento na rede parou nos anos de crise e a existência de pontos de injeção para nova potência é ainda hoje escassa, tornando-os um importante ativo económico e transacionável no mercado, que dá uma vantagem competitiva muito aliciante a quem consegue obter um título de reserva de capacidade.

Em 2019, e já com uma primeira versão do PNEC 2030, com o Roteiro para a Neutralidade Carbónica para 2050, bem como com o pacote legislativo europeu, Portugal cria o enquadramento jurídico para a realização de leilões competitivos de atribuição de potência, deixando em aberto, contudo, a possibilidade de submissão de projetos via mercado e através de acordo para reforço de rede. O leilão é identificado pelo Governo, como sendo a melhor forma de dar resposta à elevada procura do mercado e para acelerar o investimento em nova potência, dando prioridade aos projetos que originassem um maior benefício para o Sistema Elétrico Nacional (SEN). Foi assim possível realizar dois leilões de solar fotovoltaico, em julho de 2019 e em agosto 2020, que confrontou Portugal com resultados de preços históricos, que ultrapassaram, em muito, as expectativas da maioria dos atores do setor. Apesar dos excelentes resultados do leilão, não deixa de ser importante refletir, mais uma vez se faz sentido adotar uma estratégia de leilão baseada principalmente num mecanismo financeiro de critério único de preço, e como se consegue assegurar a seleção de projetos sustentáveis, de qualidade para o SEN e com capacidade para abranger os vários atores que representam o tecido nacional.

Com a elevada competitividade dos leilões, e mesmo perante a situação excecional de crise económica e financeira devido à pandemia da Covid-19, a corrida aos pontos de ligação explode. O sistema paralelo de atribuição de capacidade de reserva é entupido por pedidos, chegando-se a 2020 a um volume de mais de 450 solicitações à REN para análise de reforço de rede que, entretanto, atingiram os 85 GW, sobre os quais não existia um plano ou critério de solução específico, levando posteriormente à necessidade das publicações de termos de referência para análise dos projetos.

O setor solar fotovoltaico precisa de uma estratégia coesa, assente em pilares que ofereçam uma transição energética justa para a sociedade, com redução de custos, mas que também promova um setor gerador de cadeias de valor sustentáveis

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Das duas modalidades em questão, leilões e acesso à RESP por acordo, pontos críticos e desafios se levantam. Para começar, existem duas vias de atribuição de pontos de ligação, que neste momento, não são comparáveis, mas o principal problema advém de nenhuma delas salvaguardar um conjunto de fatores imperativos para a criação de um setor assente num modelo sustentável de crescimento inclusivo e gerador de emprego. Neste sentido, sugere-se a integração de outros critérios que poderão ser introduzidos na fase de qualificação dos projetos. Deveria existir uma equidade na atribuição dos pontos de ligação que garantisse qualidade e sucesso dos projetos, em linha com a estratégia nacional de desenvolvimento de um tecido empresarial e técnico de elevado know-how e que promovesse a criação de emprego de valor acrescentado para o país.

O setor solar fotovoltaico precisa de uma estratégia coesa, assente em pilares que ofereçam uma transição energética justa para a sociedade, com redução de custos, mas que também promova um setor gerador de cadeias de valor sustentáveis. Aliás, esta perspetiva é um dos principais focos da visão europeia para a emergência climática e recuperação financeira, que pretende utilizar o Green Deal para transformação da economia e da sociedade para enfrentar os desafios climáticos, conservando e reforçando o capital natural da União Europeia, visando tornar a Europa líder mundial nos domínios da ação climática.

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