No final dos anos 90 do século passado, e nos primeiros anos do novo milénio, começaram a surgir em Portugal as primeiras empresas especializadas em serviços na área da QAI.
A atual legislação, publicada em 2013, beneficiando da experiência adquirida pela aplicação da legislação anterior, de 2006, no âmbito da QAI, atingiu uma muito superior qualidade técnica e científica, quando comparada com a legislação precedente. No entanto, apesar de a atual legislação obrigar ao cumprimento de requisitos para a QAI, não é explícita quanto à obrigatoriedade da realização de auditorias à QAI nem quanto à sua periodicidade. A solução encontrada pelo legislador foi a remissão para a IGAMAOT, que é um organismo “com funções próprias de órgão de polícia criminal” (sic), a obrigação de fiscalização do cumprimento dos requisitos da QAI nos edifícios. A experiência mostrou que a solução encontrada não é eficaz, pois a IGAMAOT não dispõe de recursos suficientes para cumprir a sua missão de fiscalização da QAI. A ausência de uma fiscalização eficaz levou à redução substancial do número de auditorias à QAI. Urge rever a legislação introduzindo um mecanismo eficaz de indução do cumprimento dos, já obrigatórios, requisitos para a QAI.
Note-se que, apesar do efeito negativo, para a QAI, da redução do número de auditorias realizadas nos edifícios a partir de 2013, nos últimos dez anos, a QAI nos edifícios em Portugal melhorou de forma radical devido à implementação da legislação restringindo o fumo do tabaco no seu interior.
A norma europeia EN 16798-1: 2019 publica caudais de ar novo determinados, por defeito, com vista à satisfação de visitantes. A norma americana ANSI/ASHRAE 62.1: 2019 publica caudais de ar novo determinados com vista à satisfação de ocupantes. A aplicação da legislação nacional, RECS, conduz a um caudal intermédio entre os requisitos da norma europeia e os requisitos da norma americana.
Note-se que numerosos trabalhos de investigação demonstram uma forte correlação do caudal de ventilação com a produtividade, ou desempenho, dos ocupantes, pelo que uma simples análise económica do investimento em sistemas com caudal de ar novo mais elevado demonstrará a sua viabilidade.
A proteção da saúde requer a participação da ciência médica nomeadamente das áreas de epidemiologia, bioestatística, microbiologia, toxicologia e saúde ambiental.
O sentido olfativo deteta muitos compostos químicos em concentrações várias ordens de grandeza inferiores às concentrações que podem ser prejudiciais para a saúde, no entanto, para muitos outros compostos químicos esta relação é pequena, ou mesmo inversa.
As substâncias nocivas para a saúde, presentes no ar interior, podem classificar-se como químicas, gases ou partículas, ou como biológicas, vírus, bactérias, fungos e outros micro organismos.
Para os poluentes químicos existem Valores Limite de Exposição (VLE), i.e., concentração do agente químico à qual se considera que os ocupantes podem ser expostos sem efeitos adversos para a saúde.
No que se refere aos micro-organismos importa referir que estes são essenciais à vida humana vivendo os seres humanos em perfeita simbiose com os mesmos. O conhecimento atual do microbioma humano aponta para que o corpo humano tenha mais células não-humanas do que humanas.
Um aspeto que é muito importante ter em consideração é o de que, para que um microrganismo cause doença, este deve ser transportado em dose suficiente para um ocupante suscetível.
A radiação ultravioleta (UV) danifica o ADN/ARN dos micro-organismos inativando-os, i.e, impedindo a sua multiplicação. No interior dos edifícios os micro-organismos estão protegidos da radiação solar tendo maior viabilidade.
Os contaminantes em suspensão no ar interior podem entrar no edifício vindos do ar exterior ou ser libertados no interior do edifício por processos, materiais de construção, mobiliário, equipamentos ou pelos próprios ocupantes.
Os agentes patogénicos de doenças respiratórias, como o SARS-CoV-2, podem ser transmitidos por via aérea, i.e., através da inalação de aerossóis líquidos contendo o agente patogénico. O mecanismo de formação de aerossóis através do espirro, tosse, ou mesmo da fala é conhecido e estudado há décadas. Ao tossir, as gotículas de maior dimensão, com mais de 100 µm têm um comportamento balístico caindo a pouca distância, a um ou dois metros, da fonte. As partículas de menor dimensão evaporam rapidamente atingindo, muitas, dimensões inferiores a 5 µm e ficando em suspensão no ar por extensos períodos de tempo, constituindo um aerossol.
...apesar do efeito negativo para a QAI, da redução do número de auditorias realizadas nos edifícios a partir de 2013, nos últimos dez anos, a QAI em Portugal melhorou de forma radical devido à implementação da legislação restringindo o fumo do tabaco no seu interior
As estratégias para controlar as exposições no ar interior incluem substituição (remoção da substância perigosa), isolamento, desinfeção, ventilação, por extração na fonte ou por diluição, purificação do ar e, finalmente, os hoje correntes, equipamentos de proteção individual.
A estratégia mais eficaz para controlar a exposição é a eliminação da substância nociva do ar interior.
Quando a substituição da substância nociva não é possível, a melhor estratégia será, sempre que possível, a extração na fonte, minimizando a sua difusão no volume interior.
A diluição do contaminante através da ventilação pode, caso seja conhecido o valor da geração do contaminante, ser calculado através de simples equação de balanço mássico. A adoção dos caudais de ventilação determinados por critérios de conforto é, normalmente, suficiente para uma eficaz diluição dos poluentes nocivos para a saúde.
Quando o ar exterior contém teores elevados de partículas finas, PM2.5, como pode ocorrer em meio urbano, a filtragem do ar exterior com filtros com eficiência adequada para esta dimensão de partículas é necessária. Note-se que, sendo as PM2.5 geradas em processos de combustão e não sendo permitido fumar no interior dos edifícios de serviços nem existindo equipamentos de combustão no interior dos edifícios, não há geração de PM2.5 no interior dos mesmos. Nestes casos, a aplicação de filtros com elevada eficiência de captação de PM2.5 apenas se justifica no caso de estas partículas existirem no ar exterior.
A atual situação de pandemia justifica a implementação de estratégias especiais com vista à mitigação da transmissão por via aérea no interior dos edifícios. Sintetizam-se de seguida as recomendações publicadas pela EFRIARC para operação dos sistemas de AVAC neste período de pandemia:
• Sempre que possível, operar os sistemas de ar condicionado com 100% de ar novo;
• Prolongar o tempo de operação dos sistemas de ventilação, se possível mantê-los em funcionamento contínuo;
• Desativar os recuperadores de calor rotativos;
• Assegurar que todos os sifões da rede de esgotos estão “ferrados”, i.e., cheios com água;
• Se possível, adiar as operações de substituição de filtros e limpeza de condutas;
• Caso seja indispensável a realização, neste período mais crítico, das operações de manutenção referidas no ponto anterior, utilizar equipamentos de proteção individual (EPI), pelos operacionais de manutenção das redes aeráulicas, nomeadamente máscara, óculos e luvas descartáveis, especialmente no manuseamento dos filtros de ar e fazer a lavagem eficaz de mãos com sabão ou soluções alcoólicas após a conclusão das operações.
Note-se que a substituição de filtros neste período mais crítico apenas se justificará caso a sua colmatação conduzir a uma redução relevante do caudal de ar.
Está muito divulgada a ideia de que uma filtragem de elevada eficiência conduz a uma elevada QAI. Sobre esta ideia chamo a atenção para os seguintes pontos:
• Os filtros de alta eficiência são aplicados para proteção da saúde;
• Filtros de elevada eficiência filtram, praticamente, todos os micro-organismos presentes no ar, tornando o ar praticamente estéril;
• A permanência regular em ambientes estéreis não é recomendada pela ciência médica, pois é indispensável manter um sistema imunitário devidamente treinado e habituado a lidar com agentes patogénicos e outros micro-organismos;
• Trabalhos de investigação na área da epidemiologia indicam que crianças mantidas em ambientes muito limpos apresentam maior taxa de asma e de uma ampla variedade de outras patologias. Destas investigações resultou o que se denominou a “hipótese da higiene”;
• Os filtros, com o tempo, emitem odores que prejudicam a perceção da QAI, pelo que a aplicação de filtros de alta eficiência, caros e com um elevado tempo de vida, não existindo partículas PM2.5 em concentrações elevadas no ar exterior, é prejudicial para a QAI, tanto do ponto de vista da saúde como do conforto.
Uma excelente solução seria a adoção de sistemas de filtragem com eficiência variável em função das necessidades, por exemplo utilizando filtros eletrostáticos.
Finalmente, sendo os filtros de alta eficiência aplicados para proteção da saúde, os critérios para a sua aplicação devem ser estabelecidos pela ciência médica e não pela ciência de climatização.
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