OPINIÃO 72 Bebemos água com amianto todos os dias? De acordo com relatos de antigos trabalhadores da indústria do fibrocimento, ao contrário das coberturas em fibrocimento que possuem até 15% de fibras de amianto na sua composição, as condutas, pelas suas características e uso, incorporaram cerca de 50% deste tipo de fibras, facto que deveria ser suficiente para considerar que o amianto é, muito mais, do que as coberturas das escolas. Carmen Lima* Em 2020, o Governo português anunciou a remoção das coberturas em amianto nas escolas públicas, através do então chamado ‘Programa Nacional de Remoção de Amianto em Escolas Públicas’. Logo de início, o processo é mal conduzido. Primeiro, porque apenas iriam remover um tipo de material das escolas (fibrocimento em coberturas) e não a “remoção de amianto em escolas”. Foi um investimento estimado de 60 milhões de euros, financiado integralmente por fundos comunitários no âmbito do Plano de Estabilização Económica e Social (PEES), e que foi utilizado como bandeira política. Resolveu o problema do amianto em escolas públicas portuguesas? Não! Na prática, removeu-se, aleatoriamente, um tipo de material (coberturas) sem garantir que o investimento era aplicado para minimizar a exposição de crianças, jovens e profissionais ao risco de exposição a este agente cancerígeno e, de acordo com as recomendações internacionais para a gestão do amianto, que recomendam o inventário prévio sobre a presença de amianto e a avaliação de risco. Aliás, estas recomendações internacionais chegaram a ser legisladas no panorama português com a publicação da Lei n.º 2/2011, de 9 de fevereiro e da Lei n.º 63/2018, de 10 de outubro, responsáveis por regular a obrigatoriedade de identificar a presença de amianto em edifícios públicos e privados (instalações e equipamentos de empresas privadas), respetivamente. Estes diplomas definiam, além da obrigatoriedade de identificação, o objetivo comum de “avaliar os riscos para a saúde pública, estabeleceu igualmente prazos para a elaboração de planos de identificação e remoção destes materiais”. Enquanto, em Portugal, seguimos princípios desalinhados com a informação técnica, as recomendações e os requisitos legais disponíveis, a aposta na investigação e conhecimento científico sobre esta matéria aumenta, levando a que os requisitos de gestão se tornam cada vez mais rigorosos e limitados. * Especialista Sénior em Sustentabilidade (Gestão de Resíduos e Ambiente). Doutoranda em Engenharia do Ambiente no IST (investigadora na área do amianto). Fundadora e Presidente da SOS AMIANTO - Associação Portuguesa de Proteção Contra o Amianto. Autora do livro “Não Há Planeta B: Dicas e Truques para um Ambiente Sustentável”. Ex-Conselheira do CES - Conselho Económico e Social, pela CPADA, em representação das Associações Nacionais de Defesa do Ambiente.
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