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Educação para a emergência ecológica I

Alcide Gonçalves [Arquiteta Paisagista] e Jorge Moreira [Ambientalista e Investigador]27/09/2019

«O maravilhamento pela Natureza, que o olhar da criança transmite, faz com que a flor, a borboleta ou o animal sejam percecionados como elementos seus familiares. Maltratar esses seres é sentido naturalmente como algo de profundamente errado pela maioria das crianças».

Limitar a educação à transmissão de conhecimento académico é correr o risco de estupidificar os alunos, reduzindo-os à competição com os computadores, ao invés de focar em características humanas fundamentais que permitem que a educação fique à frente dos progressos tecnológicos e sociais. Pensar sobre a verdade, domínio do conhecimento humano e da aprendizagem; sobre o belo, domínio da criatividade, da estética e do design; sobre o bem, domínio da ética; o justo, domínio da vida política e cívica; o sustentável, domínio da saúde da natureza e física. São apenas alguns exemplos. As competências sociais e emocionais que nos ajudam a viver e trabalhar juntos são cada vez mais importantes para o sucesso no trabalho e na vida. Essas são as competências necessárias para definir metas, trabalhar em equipa e gerir emoções. Desempenham um papel essencial em todas as fases da vida. Juntamente com as capacidades cognitivas e de aprendizagem, é importante que os alunos desenvolvam fortes competências sociais e emocionais, que os vão ajudar a equilibrar e definir a sua personalidade. Isto pode incluir traços de caráter como perseverança, empatia, resiliência, “mindfulness”, ética, coragem ou liderança.

Andreas Schleicher, diretor do departamento de Educação da OCDE

Foto: Alcide Gonçalves
Foto: Alcide Gonçalves
Alguns pedopsicólogos e filósofos chegaram à conclusão que a criança nos primeiros estágios de vida traz consigo uma perceção bio e ecocêntrica da vida. O maravilhamento pela Natureza, que o olhar da criança transmite, faz com que a flor, a borboleta ou o animal sejam percecionados como elementos seus familiares. Maltratar esses seres é sentido naturalmente como algo de profundamente errado pela maioria das crianças. Ora, sendo este facto facilmente verificável por pais e educadores, porque é que a dada altura do seu percurso de vida, uma criança outrora sensível, se torna num ser humano adulto capaz de destruir uma floresta inteira pujante de vida, de diversidade biológica e importante para as presentes e futuras gerações, só para obter rapidamente e facilmente lucro para si próprio ou para os interesses aos quais se encontra associado? Somos capazes de adivinhar que algo de errado se passou durante a sua formação como indivíduo, nomeadamente durante o seu percurso escolar.
De facto, os curricula refletem a cultura dominante da sociedade, determinada por uma visão padronizada marcadamente antropocêntrica, utilitarista, egoísta, competitiva, materialista e até especista, sem colocar em causa os seus modelos. Os educandos são treinados para desempenhar um papel na sociedade tal como ela é, encaixando-se num mundo de empregados e consumidores, ao que Paulo Freire denominou de ‘modelo bancário’ desumanizante e opressivo da educação ocidental, que pensa no conhecimento como capital que pode ser depositado em estudantes vazios e depois extraído como dinheiro. Na mesma linha, a Natureza é dada ao aluno como um conjunto de recursos inanimados que podem ser explorados e transformados em ativos que alimentam a economia vigente. As externalidades negativas e os serviços ecossistémicos raramente são considerados. Segundo os investigadores do Stockholm Resilience Centre, este modelo económico globalizado é o principal promotor da crise ecológica, mas na verdade, o que impulsiona este modelo, é a cultura de afastamento e domínio da Natureza que o sistema educativo hegemónico reflete.
Este modelo educativo está longe de formar indivíduos livres pensadores, eticamente responsáveis e cidadãos conscientes, que consigam atender às exigências prementes de si mesmos, da sociedade e do Ambiente. O resultado deste sistema é a crise multidimensional, cuja crise ecológica é a sua manifestação mais evidente. Esta crise é uma ameaça que coloca no fio da navalha o futuro da Humanidade, assim como de muitas outras formas de vida que coabitam connosco no nosso planeta. A dimensão da crise ainda se manifesta na iniquidade e na injustiça social – que explora uns, facilitando outros; e na depressão – um desespero interior que emana do desfasamento do indivíduo aos seus mais profundos propósitos de vida.
Foto: Jorge Moreira
Foto: Jorge Moreira
A própria arquitetura e localização das escolas, confinadas a cabines fechadas sem contacto direto com a Natureza, e onde a transmissão de conhecimentos é virtual e alienada de uma ética abrangente, afasta ainda mais os alunos e, por consequência, as sociedades da Natureza e do mundo real. O conhecimento chega fragmentado em componentes científicas, sendo muitas vezes projetado abstratamente numa tela. Isto quer dizer que os conteúdos são aprendidos na maior parte das vezes fora do seu contexto, e.g., a abordagem de um rio na sala de aula não fornece a dimensão das particularidades que entram pelos sentidos, emoções, estética e holismo, que a sua presença real transmite. Paralelamente, fragmentar o conhecimento em matérias, programas, cursos, lições e objetivos não fornece uma visão global dos problemas da sociedade, nem do Ambiente. A par disto, o ensino convencional passa uma narrativa técnico-científica do mundo, que nem sempre se encontra de acordo com a dinâmica da vida, e por esse motivo, é uma narrativa incompleta, e até muitas das vezes errada, que o educando absorve. A visão sistémica que marca os elos entre os seres vivos e estes com os aspetos abióticos, a ligação espiritual que liga tudo a tudo, a intuição, a estética, o valor das emoções e a importância com o contacto com a Natureza encontram-se normalmente ausentes na escola e isto põe em causa a essência da própria humanidade e reflete as fragilidades e as lacunas do ensino. Uma Educação com uma visão fragmentada, onde predomina um Homem à-parte e acima da Natureza e vocacionada para repercutir modelos competitivos, que potencia indivíduos ego e antropocentrados, alguns deles, futuros quadros de grandes empresas ou líderes políticos, vai continuar a promover a insustentabilidade e a indiferença perante as outras formas de vida ou a vida como um todo. Precisamos de uma nova Educação capaz de solucionar a crise multidimensional que nos abala.
Uma Educação com uma visão fragmentada, onde predomina um Homem à-parte e acima da Natureza e vocacionada para repercutir modelos competitivos, que potencia indivíduos ego e antropocentrados, alguns deles, futuros quadros de grandes empresas ou líderes políticos, vai continuar a promover a insustentabilidade e a indiferença perante as outras formas de vida ou a vida como um todo. Precisamos de uma nova Educação capaz de solucionar a crise multidimensional que nos abala.

Dúvidas não se colocam quanto aos inputs trazidos pelo conhecimento científico aos próprios campos da ciência que todos aprendemos nos manuais da escola e os contributos que veio trazer e.g. à mudança de pensamento ao longo das épocas e também, a transformação à vida de todos os dias através das múltiplas aplicações tecnológicas. Mas, constata-se, em simultâneo, a existência de um desfasamento entre a atual visão do mundo e as práticas e valores adotados na nossa sociedade moderna o que pode colocar em causa a sobrevivência da nossa espécie.

Foto: Alcide Gonçalves
Foto: Alcide Gonçalves
Um ensino apoiado só na ciência e no desenvolvimento do pensamento racional poderá não ser suficiente para construir identidades ricas, onde se privilegiam os talentos de cada individuo e onde possam ser desenvolvidos os vários fatores formadores de identidades como a disciplina interior ou fatores fomentadores de solidariedade, compaixão ou outros. É necessário não esquecer que os processos de ensino e de educação intelectual de jovens, ao visarem a sua formação geral e integral, devem acrescentar a essa parte intelectual, a formação sócio-afectiva e moral.
No ponto 2 da Declaração de Veneza (UNESCO, 1986) é referido que o conhecimento científico, devido a seu próprio movimento interno, chegou aos limites onde pode começar o diálogo com outras formas de conhecimento. Neste sentido, reconhecendo as diferenças fundamentais entre a ciência e a tradição, constatamos não a sua oposição mas a sua complementaridade. O encontro inesperado e enriquecedor entre a ciência e as diferentes tradições do mundo permite pensar no aparecimento de uma nova visão da humanidade, até mesmo num novo racionalismo, que poderia levar a uma nova perspetiva metafísica.
É importante abandonar o estudo linear dos conhecimentos que conduzem à visão fragmentada do mundo e ir em busca de novos métodos de educação que aprofundem os nossos laços com a Natureza e possam abrir as nossas mentes para um pensamento mais próximo da complexidade da vida no seu todo.
Foto: Jorge Moreira
Foto: Jorge Moreira

A visão sistémica que marca os elos entre os seres vivos e estes com os aspetos abióticos, a ligação espiritual que liga tudo a tudo, a intuição, a estética, o valor das emoções e a importância com o contacto com a Natureza encontram-se normalmente ausentes na escola e isto põe em causa a essência da própria humanidade e reflete as fragilidades e as lacunas do ensino.

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